Balanço do Carnaval do DF 2018

Nem só de balancê vivem os carnavalescos, mas de balanços, metas e missões também. Quem passou na noite de ontem (27/03) pelo “aquário” anexo do Museu Nacional Honestino Guimarães viu um bloco um pouco diferente ocupando o espaço. Aquele era o bloco formado de histórias, dores, sonhos e risos de quem sabe a dor e a delícia de produzir carnaval na cidade em que nascemos, a qual escolhemos para chamar de nossa. Brasília hoje é uma cidade loba, passou por tanta provação que amadureceu cedo é revelou-se como polo produtor uma cultura diversa, de alta qualidade lírica e ativista, com destaque para o Carnaval que vem levando cada vez mais pessoas para ocupar as ruas e celebrar nossa cultura debaixo do bloco, na praça, onde a banda passar.

Para muitos o carnaval só dura até a quarta-feira de cinzas, mas para as escolas de samba e blocos carnavalescos é missão para o ano todo. Para garantir ao povo o direito de celebrar a maior festa popular do planeta os carnavalescos tem que rebolar entre burocracias, falta de diálogo com os órgãos reguladores, que por sua vez não se entendem com o governo de forma a ajudar os blocos, entre outras arbitrariedades..

Essa roda de conversa promovida ontem, pela Rede Carnavalesca.org em parceria com brincantes do DF, foi imprescindível para retomar com sensibilidade e transparência os processos de produção do carnaval do Distrito Federal. Estavam presentes vários artistas, produtores, coordenadores/as de blocos e escolas de samba. A primeira a ter a palavra foi a mestra Betinha do Asé Dudú, pioneira na produção de carnaval no DF. E na sequência a produtora Cleudes Pessoa, representante do bloco Segura o Coco, conduzido pela mestra Martinha do Coco.

O  diretor da ARUC ( a mais antiga escola de samba da capital) MOA. O diretor discorreu sobre a trajetória da ARUC os desafios para manter a escola. Moa desabafa: “A ARUC desfilou pela primeira vez em 1962 e essa foi a primeira vez na história que ficou os quatro anos sem desfilar por falta de apoio governamental.” A ARUC também faz parte da Federação Nacional das Escolas de Samba, que conta hoje com cerca de 600 entidades carnavalescas de todo o Brasil, todas engajadas para promover e defender nosso rico patrimônio cultural.

Outra pauta importante levantada por Moa foi a falsa rixa entre as tradicionais escolas de samba do DF e os blocos de carnaval exposta na mídia desde o “boom” dos blocos na cidade. Para Moa “devemos pensar em atividades conjuntas para fortificar ainda mais o nosso carnaval. É função do estado apoiar manifestações culturais além de ser um direito previsto em lei por meio do artigo 215  da Constituição Federal”.

Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

O encontro teve ainda a apresentação da pesquisa socioeconômicacultural que está sendo desenvolvida pelo pesquisador e ativista cultural Paique Santarém a pedido da Rede Carnavalesca.org. O intuito da pesquisa é levantar dados reais acerca do carnaval do DF para a elaboração de políticas públicas estaduais e não partidárias, garantindo assim a realização anual da maior festa popular do planeta – o carnaval.

A Rede Carnavalesca.org agradece a quem esteve presente e a todas e todos que colaboram com nosso projeto e nossa missão como possível. Formamos um grupo de trabalho para elaboração de um documento com a avaliação do carnaval 2018, a ser encaminhado aos poderes públicos. Nossas cidades também agradecem. Os territórios Praça dos Prazeres e Setor Carnavalesco Sul também estiveram presentes, assim como o “Carnaval no Museu” e os blocos Asé Dudu, Segura o Coco, Vai com as Profanas, Calango Careta, BabyDoll de Nylon, Bora Coisar, Rejunta Meu Bulcão, Perseguidas, BEM/ MEB, Bloco Libre, Último Bloco, Chave de Ouro, entre pesquisadores, represantes de comunidades e pessoas interessadas no tema.

Entre os temas levantados na avaliação destacamos:

  • A força do carnaval do DF, sempre crescente. A potência e o esforço de cada bloco para manter o maior tesouro da nossa Cultura.
  • A coragem de cada protagonista e cada brincante que se propõe a fazer carnaval
  • A beleza da campanha por respeito e contra violências machistas, racistas e homofóbicas realizada de forma autônoma e independente pelos blocos de rua
  • A solidariedade e cumplicidade das comunidades e coletivos de carnaval. Mesmo com tamanha diversidade, conseguimos construir coletivamente nossa própria política de carnaval
  • A presença massiva da população, o que contradiz o dado oficial de público inferior a 2017
  • A grande quantidade de turistas e organismos internacionais presentes no carnaval
  • A força da organização popular no carnaval tem sido crescente
  • Muitos movimentos sociais, comunitários presentes
  • Muitas crianças e pessoas da melhor idade participando do carnaval
  • Promovemos saúde mental, cultura, lazer, educação
  • Fazemos História e movimentos a economia da capital do país
  • A necessidade de prestação de contas e transparência sobre os valores publicizados de aporte ao carnaval e a estrutura fornecida, enviada e a ausência de apoio a artistas
  • A necessidade de devolução do resultado da consultoria e do Seminário sobre carnaval realizados pelo GDF em 2017
  • Pelo fim da prática intervencionista do Estado: sobre a organização popular do carnaval, sobre os territórios, sobre a relação com patrocinadores,  na programação e horários. E as intervenções são realizadas sem construção prévia e na véspera ou até mesmo pouco antes das atividades começarem
  • Pelo fim da criminalização e da cultura de boicote e vulnerabilização por parte do Estado. Neste sentido, merece destaque o MPDFT que constantemente, atua para criminalizar e inviabilizar o carnaval no DF
  • Pelo fim imediato do uso de gás de pimenta e demais armas e violências por parte das Polícias e agentes da Agefis. É completamente inadmissível que sejam usadas armas contra o próprio povo pacifico e dentro da lei.
  • Existe explicitamente uma política de desmonte do carnaval por parte do Estado
  • A mobilidade durante o carnaval precisa de muitas melhorias
  • O edital de chamamento dos Blocos foi muito violento com artistas de carnaval. Mesmo assim foram protocoladas sugestões ao edital. No entanto, as sugestões foram ignoradas.
  • Avaliamos que a lógica da competição, disputa e meritocracia imposta pelo edital é muito violenta com a comunidade carnavalesca
  • O edital de chamamento contemplou apenas 40 atrações, mas a secretaria já sabia que eram mais de 100, porque fazer um edital que não contempla as partes interessadas ? Nem tampouco, respeita o legado das iniciativas anteriores. O mecanismo teve muitos erros em suas exigências. E pior, muita abertura para fraudes.
  • O edital de chamamento de artistas sempre foi imposto. Em 2017, avaliamos que seria uma violência a cultura política de carnaval e mais um ato intervencionista. Em 2018, infelizmente, o mecanismo se repetiu.Violentando o caráter solidário e afetivo. Impondo a meritocracia e a competitividade as comunidades carnavalescas.
  • Os dados referentes ao carnaval precisam ser publicizados pelo GDF
  • Por que tanta maldade com agentes culturais ?
  • A História vai ser contada por quem brinca o carnaval
  • Manteremos nossa voz e entidades apoiadoras
  • Seguiremos com a pesquisa socioeconômica – pedimos a todas e todos que respondam
  • Realizaremos mais encontros de fortalecimento entre Blocos e Escolas de samba
  • Seguiremos exigindo escuta e diálogo. E construção das políticas de carnaval, sem desmonte, com tempo hábil e respeito a protagonistas de carnaval

Fonte: Carnavalesca.org