O profano e o sagrado no Carnaval

“É pecado, mas no carnaval pode.” Segundo alguns pesquisadores o carnaval como festa pagã nasceu como uma forma de catarse pré-quaresma, um abençoado “enfiar de pé na jaca” com foco no renascimento do indivíduo pós folia. Trazido desde a época da Colônia como a “Festa do Entrudo” palavra vinda do latim introitus e que significa introdução, no qual a ideia era promover as brincadeiras de rua e o desfile de grandes bonecos que ridicularizavam os governantes e políticos.

Como a junção do povo com a elite sempre incomodou os herdeiros do rei, a festa logo se dividiu em duas: o Entrudo popular, que era na rua, e o Entrudo familiar, promovido nas casas das famílias de ascendência europeia. Por volta de 1800 é que vai se dar uma grande ruptura entre o Entrudo e o que hoje conhecemos como carnaval.

Durante todo ano, assim com no carnaval, o profano e o sagrado se irmanam na cultura e nas encruzilhadas das ruas do Brasil. De lá emanam cheiro de flor de laranjeira, para homenagear as santas católicas, e  defumadores para as entidades protetoras da rua, mais conhecidas como Exus. Na época da colonização da África, Exu, o mais sexual e humanizado dos Orixás, foi sincretizado como Santo Antônio, porém, graças a um grande desserviço da Igreja Católica, que costuma ligar sexo a pecado, o orixá é tido no senso comum e arbitrário como o Diabo.  Diferentemente das religiões monoteístas, no Candomblé não existe um ser incumbido de só fazer o mau e outro só o bem, afinal o bem de um pode significar o mal do outro. Tudo está interligado nessa esfera de céu e terra – aí que entra Exu, o elo entre o mundo espiritual e o terreno.

 Exu, que diabo é isso?

Agora que você já tirou essa ideia de Diabo da cabeça, entenda: Exu rege as ações humanas, o movimento e a comunicação. É puro carnaval. A essência de Exu é a sagacidade, é safo e tem a elegância de um vampiro, além de ser extremamente sensual. Exu é da noite e a noite é dele. Acredito que se Exu fosse um signo, seria áries com ascendente em escorpião, pelo caráter abre-alas e sensual. Se fosse um músico, seria Hendrix, pela musicalidade orgástica. Se fosse um filme, seria Madame Satã. Se fosse um poema, seria de Maiakovski. E se fosse um torcedor, torceria para o time que estivesse ganhando.

“Recentemente fui a uma fogueira de Xangô e lá re-conheci Exu, que me pediu uma mãozinha para desfazer a confusão do nome dele com o do Tinhoso. Um dos filhos de santo da casa, que tem Exu como orixá de cabeça, encantou-se de seu guia, incorporou Exu. Seu filho, que tem um semblante naturalmente doce, então exibia uma feição forte, mas não sisuda. Quando o orixá chegou à casa, o grave de sua voz vibrou em cada vértebra de meu corpo e ocupou todo o espaço do salão de forma intensa… e nessa encruzilhada de sentidos, Exu baixou em meu terreiro lírico e seduziu minha poesia”, relata a poeta brasiliense Marina Mara.

Laroiê, laroiarte!

Fonte: Carnavalesca.org